Notícia do G1
Microcanais ajudam os elefantes a regular a temperatura do corpo e proteger a pele contra parasitas e a intensa radiação solar

As “rugas” que marcam a pele dos elefantes africanos não são marcas de envelhecimento. Cientistas descobriram é que a pele “racha” para melhorar a qualidade de vida dos animais formando uma intrincada rede de fendas minúsculas na superfície da pele do elefante.
Essas “rugas” retêm água e lama e ajudam os elefantes a regular a temperatura do corpo e proteger a pele contra parasitas e a intensa radiação solar.
Pesquisadores da Universidade de Genebra (UNIGE), Suíça, e do Instituto Suíço de Bioinformática da SIB relatam em estudo publicado na revista “Nature Communications” nesta terça-feira, 2, que os canais de pele de elefantes africanos são, na verdade, fraturas da camada mais externa da pele.
Os cientistas mostram que a pele hiperqueratinizada do elefante cresce em uma rede de elevações milimétricas, causando sua fratura devido ao estresse mecânico de flexão local.
Banho de lama
Sabe-se que os elefantes africanos gostam de tomar banho e pulverizar a lama sob a pele. Esses comportamentos não são apenas para diversão. De fato, os elefantes africanos não têm as glândulas sudoríparas e sebáceas que permitem que muitos outros mamíferos mantenham sua pele úmida e flexível.
Devido ao seu enorme tamanho corporal e ao seu habitat quente e seco, os elefantes africanos podem evitar o superaquecimento usando as “rachaduras” da pele.
Cobrindo-se com lama, os elefantes africanos também evitam os ataques de parasitas e a exposição excessiva da pele às radiações solares.
Uma avaliação minuciosa da pele do elefante africano indica que, além de sua característica rugosidade, o tecido é profundamente esculpido por uma intricada rede de minúsculas fendas interconectadas. Este padrão fino de milhões de canais impede o derramamento de lama aplicada e permite a propagação e retenção de 5 a 10 vezes mais água do que em uma superfície plana.
‘Rachando’ a pele
Graças a amostras de pele fornecidas por cientistas e museus na Suíça, França e África do Sul, uma equipe multidisciplinar liderada por Michel Milinkovitch, professor do Departamento de Genética e Evolução da Faculdade de Ciências da UNIGE e Líder do SIB Instituto Suíço de Bioinformática, mostra que os canais de pele de elefantes africanos são fissuras devido ao stress de flexão local causado pela camada mais externa da pele, sendo simultaneamente hiperqueratinizada e de descamação deficiente e crescendo numa rede de elevações milimétricas da pele.
Utilizando um modelo computadorizado customizado, Antonio Martins, aluno de doutorado no laboratório de Milinkovitch, mostrou que a combinação desses três parâmetros é suficiente para que o estresse mecânico de flexão se acumule entre as elevações da pele durante o espessamento progressivo da pele até que se formem rachaduras.
Filhote de elefante africano — Foto: San Diego Zoo / Tammy Spratt/AFP
Dobrando-se em vez de trincar
O aspecto visual do padrão de rachaduras na pele do elefante africano pode parecer, ainda que em escalas espaciais muito diferentes, com rachaduras causadas pelo estresse de tração na lama seca.
Era tentador, portanto, supor que as rachaduras da pele dos elefantes africanos são geradas pelo encolhimento da pele. No entanto, as simulações realizadas em computador pela equipe suíça indicam que o encolhimento gera distribuições heterogêneas de fissuras que se propagam sobre as papilas, enquanto as rachaduras na pele real ocorrem quase que exclusivamente ao longo dos vales, rejeitando a hipótese de “quebra por encolhimento”.
Por outro lado, quando os pesquisadores implementaram em suas simulações o espessamento da pele (novas camadas são constantemente adicionadas na base da epiderme), o estresse mecânico de flexão acumulou-se nos vales, fazendo com que a epiderme queratinizada rachasse apenas no microambiente, reforçando os novos resultados de “quebra por flexão”.
Elefantes ajudando a entender uma patologia humana
O espessamento da epiderme queratinizada do elefante africano deve-se a um desequilíbrio entre a sua formação na base e a sua descamação na superfície da pele.
Surpreendentemente, a equipe suíça mostra fortes semelhanças entre a morfologia normal da pele dos elefantes africanos e a dos humanos afetados pela ictiose vulgar, um distúrbio genético comum (afetando cerca de 1 em 250 pessoas) que afeta a descamação e causa pele seca e escamosa.
Se validado por futuras comparações, essa equivalência faria então uma ligação notável entre uma condição patológica humana e a pele de uma espécie icônica de paquiderme.
“Esta correspondência também demonstraria que mutações semelhantes que ocorreram independentemente nas linhagens evolutivas de humanos e elefantes se mostraram desfavoráveis no primeiro e adaptativas no segundo”, diz Michel Milinkovitch. Ou seja, no caso dos elefantes, o que poderia ser um problema de pele é na verdade uma melhoria da qualidade de vida.